A SAGA DO PAU-BRASIL

Procurei mostrar a trajetória heróica do Pau-Brasil em nossa História, como se apontando no mapa o curso do Velho Chico. O Brasil, quando mais conhece, mais ama. Mais respeita ** O livro está disponível nas principais LIVRARIAS do país, distribuído pela JURUÁ EDITORA, ou pedido pelo e-mail: welingtonpinto@yahoo.com.br ; welingtonpinto@oi.com.br *** CLIQUE abaixo (View my complete profile) e veja mais sites do autor sobre literatura.

Friday, April 01, 2005

10/X - VIAGENS PELO MAR DO MEDO





x

 

         A madeira vermelha ficou mesmo muito famosa! O negócio era tão atraente e tentador que, para muitos, valia a pena atravessar o Atlântico, em sua busca, apesar das dificuldades, dos incômodos na caravelas desconfortáveis, dos riscos da longa e demorada travesseia e outros problemas inesperados.

         - Essa madeira despertava muito interesse mesmo?

         - Prefiro o termo ganância, menina.

         - Joanna, com dois enes, Professor.

         - Não vou esquecer... Pau-brasil, como sabemos, meus Caros, minhas Caras, é uma madeira de tronco duro, compacto, contém uma substância corante de tom vermelho muito vivo e brilhante, a brasileína, empegada para tingir tecido de linho, seda e algodão com um tom carmesim ou purpúreo. Um vidrinho dessa tinta custava um bom dinheiro. Naquela época, o vermelho era o príncipe das cores. Rei que se prezava tinha seu manto vermelho. Cardeais e nobres, também. Tanto interesse encarecia o produto, porque a oferta era sem menor do que a procura.

         A Professora Diana observa:

         - O sexo feminino, Gente, também teve a participação no excesso de consumo da tinta preciosa. A partir do século XVI, a mulher europeia, principalmente, a inglesa e a francesa, passou a se interessar pelos requintes da moda, atraída pelo suntuoso tom carmesim ou purpúreo: a cor da nobreza. Isso deu um grande impulso na indústria têxtil, exigindo cada vez mais dessa tinta extraída da árvore, aos milhões em nossas terras. Confere, Professor Felício?

         - Sim. Não só para tinta servia o Pau-Brasil. Os móveis da Universidade de Coimbra e de vários outros prédios públicos na Europa foram fabricados com essa rica madeira do Brasil.

         - Brincadeira!

         Iago, até então quietinho no seu canto, levanta a mão e pergunta, como se faz em sala de aula:

         - Uma viagem da Europa para o Brasil durava quantos dias?

         - Xiii!... Dias e dias. A calmaria atrasava muito uma viagem. Dois, três meses ou mais, enfrentando o mau tempo, a fome e a sede. Há notícias de navio que levou até cento e oitenta dias para cruzar o Atlântico. Boa parte da tripulação morria antes de chegar ao destino, em consequência da má alimentação, da falta de remédios e de conforto. Os marinheiros dormiam ao relento, no assoalho ou em redes espalhadas ao ar livre pelo convés, com ou sem chuva. Deixar Lisboa rumo ao Brasil ou a Índia era mesmo uma loteria. Precisava de muita sorte para chegar bem ao destino.

         - De o pessoa do navio se alimentava? – procura saber Maria Vitória ainda sem levantar o braço da tipoia, mas de olho no Chico, com receio de outra gozação.

         - Peixe, carne salgada, de porco ou de boi, bolachas secas. A conservação dos alimentos era de péssima qualidade. Depois de certo tempo, a situação tornava-se insuportável, os alimentos iam ficando ratos, apodrecidos e mofados.

         Uma menina faz careta:

         - Coitados! Ora, se estavam no mar por que não pescavam?

         - Isso os marinhos faziam sempre que possível. Mas, durante uma tempestade quem é que consegue fisgar um peixe? Quando não tinham nada mais para se alimentar, comiam ratos caçados no porão do navio ou gaivotas que voavam ao redor das embarcações. E quando nem isso mais existia, cozinhavam tudo que era de couro, como peças retiradas dos mastros, sola de sapatos, das bolsas ou de qualquer outro objeto de pele de animal.

         Cara de nojo, Geni Maria observa:

         - Se a comida, Argh, era tão ruim, a água então devia ser uma nojeira!

         - Acertou, menina. Antes da partida de um navio, a tripulação devia enchia pipas e barris de água potável suficiente para a viagem programada. Depois de duas semanas, o líquido ia-se tornando esverdinhado, viscos, cheio de bichinhos e infestado de bactérias, cada dia mais impróprio para o consumo.

         Novas caras de nojo e penalizadas.

         - Já existia pernilongo da dengue? – caçoa o Chico.

         Risos.

         - A agua servida nos navios tinha mesmo um gosto horrível, insuportável. Mas era a única fonte disponível para matar a sede.

         - Santa Maria! Ainda aparecia gente para se aventurar numa viagem dessa! – suspira Luísa, chocada.

         - Claro que sim. Eram pessoas que tinham na cabeça o seguinte lema: o mundo pertence a quem se atreve. Daí, corriam o mundo em busca de ouro, principalmente.

         - Eram muitas as doenças nos navios? – quis saber Maria Vitória.

         - Muitas. De arrepiar os cabelos. Doenças provocadas pela má alimentação, pela falta de higiene, pela dieta carente de sais minerais e vitaminas encontradas nas frutas e nas verduras, fundamentais à saúde do ser humano. Morria gente todo dia, atacada por febres malignas ou pelo medonho Mal-de-Luana. Outra doença frequente entre os navegantes era o Escorbuto, provocado pela falta de vitamina C, uma doença terrível que atacava as gengivas dos marinheiros, fazendo cair os dentes. Morriam à mingua, no maior sofrimento.

         Para viajar naqueles navios o aventureiro tinha que ter muita coragem, saúde de ferro, gostar exageradamente de dinheiro e nenhum amor à vida. Coisa de louco! Mesmo assim, o Oceano Atlântico vivia cheio de navegantes ambiciosos, que não tinham medo de tempestades em alto mar, de monstros marinhos, nem da fome, nem da sede e muito menos da morte. Eram meses ao relento dentro de uma embarcação, sem cama nem banheiro, pouca comida, enfrentando terríveis tempestades e naufrágios. Mas, para muitos era preferível uma aventura assim, do que passar o resto da vida trancafiado numa masmorra em seu país de origem.

         - Masmorra? Que isso, Professor? – pergunta Beto, espantado.

         - Cadeia. Boa parte dos navegantes eram presos por crimes praticados na vida. Ganhavam o perdão da pena em troca de uma viagem dessa para trabalhar em um navio.

         Felipe, também com os olhos arregalados, conta:

         - Monstros Marinhos! Monstros no mar? Vi na televisão...

         - Lógico que não. Antigamente, meus Jovens, o mar assombrava, porque era desconhecido. A comunicação entre os povos era muito difícil. Faltavam bons livros de informação para difundir o conhecimento ao mundo. Assim, o homem via como verdadeiro, uma escabrosa mentira, uma lenda sem nenhum fundamento.

         O Oceano Atlântico era conhecido por Mar Tenebroso ou Mar da Escuridão. Pensavam que a Terra era plana e que, depois do Cabo Não, que fica nas costas do Marrocos, as águas se despencavam num precipício sem fim, indo cair no inferno. Imaginavam ser o Mar habitado por gigantes imensos, por almas penas, por homens sem cabeça, por monstros de um olho só ou de quatro olhos pregados nos ombros, mas também por belas sereias, capazes de enlouquecer os marinheiros com seus cantos sedutores. Tudo invencionice, fantasia pura.

         Risos amarelos.

         - E divertimento, não tinha? – Vitor, ainda meio assustado com o sofrimentos dos navegantes daquela época.

         - Quase nada. Um ou outro tripulante, com sangue de artista, é que improvisava uma apresentação de teatro ou de música. Mas, para preencher mesmo as horas de ócio no convés, o jogo de cartas era imbatível.

         - Professor, dá licença? – levanta o braço a Renata.

         - Pode perguntar.

         - Por que deram o nome de Não ao Cabo Não?

         - Ali era o limite da navegação costeira da África Setentrional. Só em 1418, os navegantes João Gonçalves Zaco e Tristão Vaz Teixeira, orientados pela Escola de Sagres, do Infante Dom Henrique, conseguiram navegar além do Cabo Não, descobrindo a Ilha do Porto Santo. O limite passou a ser o Cabo Bojador.

         - Que legal! – admira Rogério.

         - Havia até um ditado popular: quem navegar para além do Cabo Não, ou voltará ou não.

         - E o Cabo Bojador foi ultrapassado por Gil Eanes, não foi?

         - Parabéns, Chico sabichão. Isso é história para outro dia.

         Jaqueline espanta-se:

         - Meu Deus! Tanto martírio para ganhar dinheiro!

         - Ainda hoje muita gente enfrenta horrores para garantir a sobrevivência. Depois, vocês poderão pesquisar sobre as profissões no Mundo. Ainda existem trabalhos que lembram o sofrimentos dos navegantes de mais de quinhentos anos atrás.

         Rodrigo dá sua opinião:

         Eu acho, Gente, que o pior trabalho é nas minas de extração de ouro ou carvão. Já vi num filme...

         Pausa.

         A manhã continua cheia de luz e sombra no Jardim Botânico, onde os meninos estão ouvindo histórias da História do Brasil. Um galo cocorica longamente, outros galos respondem. Existem soltos na área, dezenas de galos e galinhas, todos com um missão muito importante: são agentes controladores de pragas, bem treinados em comer insetos nocivos às plantas. Além de produzir ovos e pintinhos coloridos, é claro.

0 Comments:

Post a Comment

<< Home