08/VIII - O ARRENDAMENTO
VIII
O Professor retoma a narração da
história:
- Dom Manuel I, empenhado em explorar
cada vez mais as terras asiáticas, bem mais lucrativas, vai perdendo o
interesse em colonizar de imediato a nova colônia. Então, o rei teve uma ideia:
como a corte não podia se dedicar de corpo e alma à Terra Brasilis, autorizaria
alguém para fazer isso. Resolve arrendar nosso país.
- Mas um rei decidia tudo sozinho? –
pergunta Maria Vitória, sem levantar o braço com tipoia.
- A palavra de rei naquela época,
minha querida, era absoluta. Todos, aliás, chamados reis absolutistas com
poderes extremos, além de serem considerados os representantes de Deus na Terra
- um rei sancionava e executava as leis que ele próprio fazia. Luís XIV, ao
assumir o reino da França, no final do Século XVII, declarou: - O Estado sou
eu!
- Prepotente! – debocha Jaqueline.
E com sotaque português, o Professor
imita Dom Manuel I:
- Caros Ministros, tomei, em meu nome
e em nome de Deus, a decisão de arrendar a Terra de Santa Cruz, assim como fez
D. Afonso V, que, em 1469, arrendou a Fernão Gomes o comércio da Guiné. Certo
deu lá, certo dará nas terras dos brasis. A razão é muito simples: no momento
investir nas Índias é mais lucrativo aos cofres portugueses, ora, pois, pois.
Risinhos gerais.
- Como ninguém se manifestasse
contrário à decisão irrevogável, o rei ordena: - Que a ata dessa reunião seja
lavrada e que o Edital do Arrendamento esteja redigido imediatamente. Quero-o
afixado nas portas das principais igrejas de Portugal, como também deverá ser
enviado para todos os jornais que circulam em território europeu.
O Professor provoca, com um ligeiro
raspar de garganta, uma pausa. Dona Diana observa:
- Podemos dizer que essa foi, então,
a primeira experiência em privatizar um monopólio no Brasil. Vejam que, durante
muito tempo o Brasil teve um dono. Muito bem, Professor Felício, vá em frente
que a turma está gostando. Até os passarinhos escutam lá nos galhos.
Risinhos e cutucadas.
- Boa lembrança, minha cara. Ganhou a
concessão um cristão novo, isto é: um judeu convertido à fé cristã, o
comerciante espanhol Fernão de Noronha, também conhecido por Fernão de Noronha,
representante de empresários alemães de origem judaica, o grupo dos Fugger, que
detinha o monopólio do cobre na Europa. O contrato permitia aos arrendatários
explorar por três anos o Pau-Brasil em novecentas léguas, mais ou menos cinco
mil quilômetros na costa brasileira. Em troca, teriam que estabelecer feitorias
e defender a Colônia contra a cobiça de estrangeiros, além de pagar um quinto,
isto é, vinte por cento, dos lucros à Coroa. Esse arrendamento foi prorrogado
três vezes.
Chico ergue-se, outra vez:
- Professor Felício Valverde...
- Você pulou o Esmaragdo, Chico...
- O que é mesmo arrendamento?
- É o mesmo que alugar, por exemplo,
uma fazenda ou um sítio, onde o inquilino pode usar a propriedade como quiser,
explorando tudo para ganhar dinheiro.
Felipe aproveita para tirar uma
dúvida:
- Professor Valverde... Não, não vou
pronunciar seu nome todo... Pode ficar sossegado... O que era mesmo uma
feitoria?
- Um local fortificado para
armazenamento de toros de Pau-Brasil, já prontos para o embarque. Entre várias
feitorias implantadas nas costas brasileiras, uma das mais importantes foi a de
Itamaracá, fundada em 1526, onde hoje é o Estado de Pernambuco.
Maria Vitória protesta, com o braço
levantado, o sem tipoia:
- Na verdade, foi a primeira
iniciativa para devastar nossas florestas, para degradar o meio ambiente
brasileiro. Céus! Sabemos que Pedro Álvares Cabral encontrou aqui uma floresta
vasta e rica, toda arranjada, cada árvore no seu lugar; porque Deus assim
queria a nossa Pátria!
- Parabéns, pela observação, minha
querida.
- Vender Pau-Brasil dava o mesmo
lucro que vender especiarias da Índia? – pergunta Geni Maria.
- Não. Veja Você: um navio carregado
de Pau-Brasil valia sete vezes menos do que um navio carregado de especiarias
da Índia, mesmo assim capaz de apurar mais de trezentos por cento de lucro.
- Puxa! E quanto o tal Fernão de
Noronha pagava pelo aluguel do Brasil?
- Existem controvérsias... É Marilda
mesmo seu nome!?... Já estou conhecendo o nome de vocês, ótimo! Historiadores
afirmam que havia parceria, entre os arrendatários e a Coroa Portuguesa, também
nos lucros. Outros garantem que o preço do arrendamento era fixo, isto é, mil
Ducados por ano. Deveria ser um ótimo negócio, pois o contrato com o grupo de
Fernão de Noronha durou até 1513, quando o direito de arrendamento foi arrematado
por Jorge Luís Bixorda.
- Poxa, que nome mais esquisito! –
critica Marisa.
- E em 1516, Nuno Manuel ganhou a
concorrência.
- O quê!... Ducado! – exclama Ana
Lúcia, sem levantar nenhum braço.
- Ducado era uma moeda de ouro ou
prata, cunhada pela primeira vez em Veneza, em 1284. Na época, também utilizada
em Portugal.
- Seria quanto no dinheiro do Brasil,
hoje?
- Cálculo difícil. Tanto tempo passou
de lá para cá... O melhor é sugerir à Professora Diana que combine com Vocês
uma pesquisa sobre essa moeda, o Ducado. Senão nosso bate-papo vai até o
escurecer. Como Fernão de Noronha era um comerciante de bom faro para negócios,
deve ter aumentado em muito a fortuna dos empresários que representava,
explorando o Pau-Brasil.
- Também o trabalho era só mandar
índio cortar Pau-Brasil, encher o navio com as toras e levar para vender, não
é? – critica Ana Júlia.
- Havia, sim, outros problemas, mas,
na essência, era mais ou menos assim mesmo. Para essas viagens, admitia-se
gente de toda espécie, principalmente prisioneiros que aceitavam viajar em
troca da liberdade. Eram muito perigosas, aquelas viagens!
Ana Laura procura tirar outra dúvida:
- O arquipélago de Fernando de
Noronha foi descoberto por Fernão de Noronha?
- Não. Por Gonçalo Coelho, que
trabalhava para ele, em 1503. No mesmo ano, Gonçalo também fundou uma feitoria
na Bahia e outra em Cabo Frio.
- Foi esse Comandante, para puxar o
saco do patrão, que sugeriu mudar o nome do arquipélago de São João para Fernão
de Noronha? – pergunta Beto com ar de brincadeira.
- Não, não foi. Mais tarde, o
arquipélago foi dado de presente pela Corte Portuguesa a Fernão de Noronha.
Daí, mudar o nome foi só um capricho do dono. Mas além de São João, também se
chamou Quaresma e São Lourenço. Darei um pirulito de mel de abelha a quem
adivinhar por que Gonçalo Coelho batizou o arquipélago com o nome de São João?
Isabela arrisca um palpite:
- Aposto que era Dia de São João!
- Muito bem, aprendeu direitinho.
Aqui está o pirulito.
- Epa! – acertei na mosca. Quero ver
alguém aí me chamar de decoreba...
- No final, todos vão ganhar desse
pirulito. É feito pelo Porteiro Juraci, de colmeias daqui mesmo do Jardim. Vão
adorar. Ele entende de coisas naturais como poucos. Também...
Obas gerais.
0 Comments:
Post a Comment
<< Home